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Me chama muito a atenção o quanto usamos o bom senso como um parâmetro de confiança. As expressões: ‘É tudo uma questão de bom senso” ou “Basta usar o bom senso” trazem a sensação de que a medida é clara, confiável e até mesmo partilhada pela maior parte das pessoas.

Fico me perguntando como isto é possível. Não temos um bom senso comum, na realidade nem sei se podemos dizer que temos bom senso.
Quando eu vejo crianças bem pequenas brincando na praia com um número enorme de potinhos e pazinhas de plástico, que a cada nova onda, vão sendo levadas para o mar, enchendo de mais lixo nossos oceanos. Fico me perguntando onde está o bom senso?

Quando eu vejo pessoas fazendo uso de equipamentos de som enormes, impondo suas preferências aos demais vizinhos, ou em espaços públicos. Onde está o bom senso?

Quando escuto de agressões físicas decorrentes de uma ruptura amorosa, onde podemos enxergar o bom senso?

Onde achar o bom senso quando funcionários usam sua posição para lucrar em detrimento de outros?

Bom senso de quem?

Me parece que optar pelo bom senso é confiar em que o outro pensa igual a mim, ou seja, tem os mesmos valores e desejos que eu. Que o objetivo é o benefício da maioria, e o entendimento de que as regras são para organizar o convívio social. Princípios bem distantes da ideia de focar em desejos individuais ou flexibilizar as normas quando for do meu interesse.

Numa sociedade em que se prioriza o olhar para o benefício próprio, mesmo que isto incorra num malefício ao coletivo, traz uma sensação de desconfiança e insegurança em relação ao outro. E isto repercute no social:
“Está me pedindo dinheiro, mas não consegue trabalho ou usa este dinheiro para beber?”. “Não voto, nenhum político vale a pena!”

Este modo de encarar o mundo não surge da noite para o dia, se olharmos para trás, o modo como nosso país foi construído, e para as pessoas que fizeram parte de sua formação, veremos que o “jeitinho brasileiro” foi o jeito que encontramos para dar conta das dificuldades iniciais. Mas até quando?

Trazendo para a atualidade

Quando observo pessoas circulando pelos parques, por exemplo, sem fazerem o uso de máscaras, o que esta por trás deste comportamento? “Eu já fui contaminado e não sou mais um risco?”, “Não consigo correr com a máscara pois sinto uma enorme falta de ar?” “O uso da máscara dispara em mim uma sensação de pânico?”

São todos argumentos válidos, mas de novo, o foco não está no individuo? Onde está a certeza de que não se contaminará novamente? Se eu não consigo usar a máscara não deveria evitar locais com muitas pessoas? Pensar no coletivo gera limitações individuais, não há dúvida, mas eu também colho deste coletivo, o que neste caso, seria a eliminação do uso de máscara mais rapidamente, ou a curto prazo, circular em um ambiente mais seguro.

Boa vontade…

Talvez devamos substituir o conceito de “bom senso” para “boa vontade”, isto não significa abrir mão de ter bom senso, mas abrir mão de esperar que o que consideramos bom senso seja exatamente o que o outro imagina.

A atitude ativa de ter boa vontade em direção ao outro, talvez nos leve a respeitar melhor as diferenças, e a acreditar que se o outro não correspondeu foi por absoluta falta de possibilidade, e não um gesto de contravenção. Permitir o benefício da dúvida, acreditar que as pessoas são passiveis de confiança, pode trazer um grande conforto. Com certeza não é uma medida exata, ou um parâmetro claro, mas pode trazer boas surpresas e sobretudo não estaremos esperando algo certo de uma medida incerta, mesmo porque, tudo tende a ser melhor quando há boa vontade.